Redenção do Amor Perdido
- Flora Dominguez
- 6 de nov. de 2023
- 2 min de leitura
Sob a cúpula celeste, onde estrelas parecem sussurrar segredos eternos, a mulher, divindade e carne, entrega-se ao rito ancestral de doar-se. Na infinitude de seu ser, ela é o mar que acolhe rios — rios de homens, fracos, famintos por serem salvos. Salvos de si mesmos, das suas misérias inconfessas, da sua virilidade falha.
É a mulher, oh paradoxo divino, quem porta o cálice da redenção, quem, com seu ventre, gesta a vida e, com seu coração, gesta o perdão. Perdão esse, servido em doses largas aos homens de peito oco, que com suas mãos trêmulas e olhares desviados, clamam por mais uma chance. E ela, como um sol que não conhece ocaso, irradia a oportunidade após oportunidade, numa esperança quase mística de que, naquele barro humano, floresça algo que se assemelhe à grandeza.
Os homens fracos, ah! Eles se arrastam às portas dessas mulheres-fortalezas buscando abrigo, guiados pelo instinto primário de encontrar em outro ser a fortificação que lhes falta. São meninos em corpos de gigantes, são súplicas silenciosas em uma noite sem fim. E as mulheres, tecendo a paciência das eras, aguardam. Elas, fazedores de milagres cotidianos, nutrem a crença de que o amor pode elevar, transformar, transmutar o chumbo da fraqueza em ouro de uma força compartilhada.
Porém, nem toda paciência é infinita, nem toda espera é estéril. Há, em cada mulher que aguarda, um universo em movimento, estrelas nascendo e morrendo em seus olhos. Há, nas suas mãos que acariciam o vazio, uma criação que pulsa, um mundo que se quer erguer sobre alicerces de sonhos e realidades.
Nessas infinitas chances que se dão, há um desgaste, um fio de esperança que se estica até se tornar invisível aos olhos. Esses homens, essas crianças perdidas no labirinto de suas inseguranças, sugam, sem saber, a vitalidade que lhes é oferecida como alimento para a alma. E, oh triste ironia, muitas vezes, ao final, resta à mulher apenas a casca, o eco de um amor que foi mais servidão do que partilha.
Contudo, a mulher é feita de matéria cósmica, e em sua essência, existe a resiliência dos astros. Ela, que se doou incontáveis vezes, aprende com o tempo — esse mestre implacável — que há limites para o dar-se. Que cada chance dada é um universo que se expande dentro dela, e que cada desilusão é uma estrela que se apaga.
Por fim, ela se ergue, não mais como quem espera, mas como quem sabe. Sabe que o amor próprio é a primeira fundação de qualquer templo que valha a pena entrar. E aos homens fracos, ela entrega a bênção final da liberdade, a liberdade de se encontrarem ou se perderem no vasto oceano da existência, enquanto ela, mulher infinita, parte para a construção de novos mundos, mundos onde a força não reside na musculatura dos braços, mas na inquebrantável dignidade do espírito.
E assim, nas infinitas chances que outrora foram dádivas, agora ela se guarda, ela se guarda para si, não por egoísmo, mas por saber que o amor mais profundo é aquele que começa em nossa própria alma, irradiando-se como uma constelação que guia os navegantes de volta ao lar. A mulher, infinita em seu poder, redescobre-se não mais como uma dádiva aos outros, mas como a própria vida, vasta, indomável, e inteiramente sua.
Texto escrito pela Psicanalista Flora Dominguez

Comentários