Você precisa de um homem! Será?
- Flora Dominguez
- 21 de abr. de 2022
- 7 min de leitura
Você precisa de um homem, sempre ouvia amigas dizendo isso para mim quando estava mal, mas no passado também disse inúmeras vezes para muitas conhecidas. Por que não falo mais? Porquê passei por um tratamento da dependência emocional que mudou a minha forma de pensar e me comportar. Esse é o grande dilema que acompanha a maior parte das mulheres que são dependentes emocionais, pra não dizer que esse pensamento acompanha 95% das mulheres, vou dizer que 80% pensam justamente que se ficar sem um homem elas ficarão sozinhas e ninguém mais as enxergarão.
Aprendemos desde crianças que precisamos ser cuidadas e é esse tipo de pensamento é que derrota a maior parte de nós mulheres. No livro de Colette Dowling - Complexo de Cinderela ela diz: "Por causa da forma como a sociedade as estabelece, as mulheres nunca mais experimentam a necessidade de desenvolver a independência - até que alguma crise na vida adulta exploda sua complacência, mostrando-lhes quão tristemente indefesas e subdesenvolvidas elas se permitiram ser".
Foi exatamente o que aconteceu comigo e com uma grande parte das que já cuidei e muitas outras que se encontram em tratamento comigo e com outros colegas. Quando faltava um ano para meus quarenta anos a crise se instalou de uma forma que não tive opção. Fiquei diante de uma situação humilhante, ter permitido que um homem tomasse conta de minha mente a tal ponto de perder totalmente o controle sobre minha vida.
É fato que vivenciar tanto sofrimento por tantos anos faz uma mulher não se olhar com desejo, ás vezes ela até pode se achar bonita, mas ela não consegue se enxergar com tantos valores. Era o que acontecia comigo e com centenas de mulheres que já cuidei. O relacionamento termina e achamos que a culpa é toda nossa, mas o relacionamento não é composto por duas pessoas? Porque assumimos a responsabilidade cem por cento? Porquê a sociedade machista sempre apontou a mulher como culpada por tudo que acontece. Numa discussão quantas pessoas dizem para as outras: "Sua mãe não te deu educação não?". Quantas engravidam e elas ouvem: "Onde estava sua mãe que não viu isso?". Na escola a grande parte se dirige as mães, porque não enviam um bilhete para o papai comparecer na escola? Porquê ela é a mãe, tudo é a mulher e com isso outras mulheres que também vivem dessa maneira tratam outras mulheres de uma forma cruel e sem um pingo de empatia.
Colette Dowling em seu livro diz: "Enquanto evitamos levar o crédito pelo sucesso, as mulheres aproveitam a oportunidade para assumir a responsabilidade pelo fracasso. Os homens tendem a externalizar as razões de seu fracasso, colocando-o em algo ou em outra pessoa. Não as mulheres, que absorvem a culpa como se tivessem nascido para ser capachos da sociedade. (Algumas mulheres gostam de falar de sua disposição de assumir a culpa como se fosse uma forma de altruísmo. Não é. As mulheres assumem a culpa porque acham assustador confrontar aqueles que são realmente culpados de irregularidades.)
Mulheres criam filhos, mulheres ficam noites acordadas com seus filhos doentes, mulheres pagam escolas, materiais escolares, tratamentos, sofrem caladas, sofrem abusos dentro de seus lares, pagam as contas, levam seus filhos em médicos, dentista, terapeutas, passeiam, educam, amam, dão atenção, carinho, muitas dão a alma e uma vida inteira.
Porque apesar de fazermos isso tudo ainda achamos que somos incompetentes e que necessitamos de homens para cuidar de nós?
Colette Dowling diz em seu livro: "As mulheres (...) foram incentivadas desde crianças a serem dependentes em grau insalubre. Qualquer mulher que olhe para dentro sabe que nunca foi treinada para se sentir confortável com a ideia de cuidar de si mesma, defender-se, afirmar-se. Na melhor das hipóteses, ela pode ter jogado o jogo da independência, invejando interiormente os meninos (e mais tarde os homens) porque eles pareciam tão naturalmente auto-suficientes. Não é a natureza que confere essa auto-suficiência aos homens; é treino. Os machos são educados para a independência desde o dia em que nascem. Assim como sistematicamente, as mulheres são ensinadas que elas têm uma saída - que algum dia, de alguma forma, elas serão salvas. Esse é o conto de fadas, a mensagem de vida (...) Podemos nos aventurar por conta própria por um tempo. Podemos ir para a escola, trabalhar, viajar; podemos até ganhar um bom dinheiro, mas por baixo de tudo isso há uma qualidade finita em nossos sentimentos sobre independência. Apenas aguente o tempo suficiente, diz a história da infância, e algum dia alguém virá para resgatá-la da ansiedade de uma vida autêntica. (O único salvador que o menino conhece é ele mesmo.)
Desde pequenas ganhamos bonecas para cuidar e amar, fogãozinho para fazermos comidinha para a filhinha de brincadeira. Não é brincadeira, estamos sendo motivadas a achar que a felicidade se resume a um casamento, isso se chama treino. Quando tinha oito anos era normal na roda de meninas fazermos joguinhos para saber o nome do nosso marido. Que grotesco! É revoltante isso já estar tatuado em nós desde pequenas.
São os velhos padrões da sociedade machista que persegue as mulheres a milhares de anos, antigamente mulheres sozinhas eram chamadas de encalhadas, titias, muitas que não podiam gerar filhos eram chamadas de úteros secos, mulheres que se separavam eram perdidas, as mães solteiras como eu então eram encaradas como mulheres fáceis que estavam dispostas a tudo por um simples olhar medíocre de um homem, muitas eram colocadas para fora de casa por seus pais por terem acreditado que se entregassem sua virgindade seriam protegidas.
Uma vez ouvi meu ex marido falando que quando tinha vinte anos, ele e os amigos apostavam quantas mulheres conseguiriam tirar a virgindade com a promessa de casar. Que nojo fiquei quando ouvi isso na época e hoje com o conhecimento que tenho fico pensando como todas elas devem ter sofrido.
Por séculos incutiram nas gerações preconceitos ridículos e sem noção e com isso nos tornaram mulheres inseguras. Deformaram a nossa maneira de nos olharmos, muitas de nós ainda não se enxergam sem um homem ao seu lado.
Como Colette Dowling diz em seu livro: "A fobia se infiltrou tão profundamente na experiência feminina que é como uma praga secreta. Foi construído ao longo de muitos anos pelo condicionamento social e é ainda mais insidioso por estar tão completamente aculturado que nem mesmo reconhecemos o que nos aconteceu.
As mulheres não se tornarão livres até que parem de ter medo. Não começaremos a experimentar uma mudança real em nossas vidas, uma emancipação real, até que comecemos o processo - quase uma lavagem cerebral - de trabalhar com as ansiedades que nos impedem de nos sentirmos competentes e completas".
A mulher tem uma enorme capacidade de recomeçar, renascer e de se reinventar. Eu sou prova disso, muitas que cuidei e ainda cuido. Podemos sim sermos felizes sozinhas do que com uma figura masculina ao nosso lado.
Construímos castelos cor de rosa para sermos salvas, mas de quem? A mentalidade da sociedade machista disseminou essa mentira para que acreditássemos piamente que sem eles nada somos e nem seríamos, que vamos viver isoladas na solidão e isso tudo é MENTIRA. A sociedade nos condicionou a sermos mulheres do fulano de tal. Temos que ficar por detrás de um homem, porque não podemos assumir quem somos de verdade.
Nos criaram para sermos as meninas boazinhas, que fala, anda, se comporta bem, até porque menina boa não pode falar palavrões, não fica chateada, não discorda das pessoas. Quantos casamentos foram arranjados? Quantas foram sacrificadas porque não puderam fazer suas escolhas? Quantas foram punidas por serem somente elas? Quantas foram queimadas como bruxas porque pensavam livremente e a sociedade não as aceitava, a religião as condenou ao caldeirão do inferno porque queriam seu lugar no mundo.
Essa mentalidade foi incutida dentre de nós, foi tatuada em nós, mas quem disse que ela deve continuar com todas nós? Não deve, não pode e não queremos!
Quantos pais e mães machistas criam seus filhos para pegarem as lindas meninas que estão se formando? Quando minha filha estava com 12 anos, minha vizinha teve a coragem de falar a seguinte frase que muitos homens imaturos e mulheres machistas repetem: "Prenda sua cabrita que meu bode está solto", eu fulminei ela com o olhar e respondi: espero que você tenha feito um bom plano de saúde para ele.
Histórias nos foram contadas, exemplos nos foram colocados com versões distorcidas, filmes e novelas altamente dramatizantes que a mocinha sempre sofre muito por amor e depois é feliz para sempre porque ele chegou a conclusão, depois de trinta anos que ela o ama de tanto fazer loucuras.
Nos condenaram a sofrer por muito tempo, a ter fé eterna na mudança de quem esta anos ao nosso lado e que não quer mudar, nos ensinaram a fazermos vista grossa perante a traição do marido com a desculpa que eles tem instintos, nos mostraram um mundo de anulações e esqueceram que precisaríamos de um emocional e um psicológico para criarmos filhos sozinhas, sustentar uma casa e ainda aguentar o lindão com um sorriso no rosto depois de trabalhar incansavelmente.
A sociedade quer uma mulher automática, que não reclame, que não corra atrás de seus direitos, que não se ame, que não se valoriza, que se esconda, que seja o modelo de uma mulher que não tem voz e que não sabe que ela tem direitos sobre sua vida, seu corpo, seu emocional e mental. Porque mulheres equilibradas e saudáveis diz não a tudo que as faz sofrer e principalmente ela chega a conclusão que se não for com ele, ela será muito mais feliz sozinha ou com alguém que a mereça de verdade.
Assumam seu lugar no mundo e fiquem tranquilas hoje não seremos mais queimadas como bruxas, mas devemos ser agradecidas a muitas que já vinham lutando por nosso lugar ao mundo, agora a decisão é sua se vai continuar com esse pensamento ou irá se libertar e ser feliz com a linda mulher que você é e com quem realmente quer ser.
E se um dia você quiser alguém será para multiplicar e não para te dividir em pedaços.
Com amor
Flora Dominguez

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